Em outro artigo, abordei o tema empresas subdesenvolvidas. Um cliente, Daniel Amaral, de São Paulo, fez três perguntas sobre o assunto:
1ª) Gostaria que você comentasse sobre as empresas que não são desenvolvidas como você bem captura em seu texto e que estão em estágios anteriores. Por onde devem iniciar, que valores são essenciais, independente do estágio de desenvolvimento, tamanho e maturidade? Ou seja, o que é ESSENCIAL para uma empresa pequena e familiar crescer?
2ª) É possível pensar em tê-los (os valores e competências) por fase de desenvolvimento das empresas?
3ª) Considerando a sua experiência, que contraponto você faria com as empresas internacionais estabelecidas lá fora, o que é replicável ao nosso modelo, o que é próprio do nosso contexto brasileiro e que precisamos desenvolver com extrema competência sob pena de não alcançarmos o desenvolvimento pleno, simplesmente copiando as best-practices das matrizes?
Caro Daniel, o exercício da atividade de consultoria proporciona um raro privilégio: o consultor pode, se for eclético, estabelecer comparações variadas entre modelos de governança, valores, segmentos e tamanhos de empresa, entre outros fatores. Tenho feito trabalhos, ao longo dos anos, em empresas com faturamento bruto anual que vai de 3 milhões a 15 bilhões de dólares. E afirmo para você: cada porte de empresa tem as suas doenças características. Nesta resposta, quero me concentrar nas pequenas empresas. Por que razão elas têm, normalmente, muitas dificuldades para crescer? Por que a maioria desaparece pelo caminho? Quero também dizer a você que é muito mais difícil, na maioria das vezes, prestar consultoria para pequenas empresas do que para empresas maiores. Observe que a maior parte da bibliografia disponível, os estudos de cases e os exemplos das salas de aula nos MBAs são preparados para empresas médias e grandes. O motivo é óbvio: quase ninguém quer encarar empresas pequenas e com poucos recursos. A necessidade de competência aumenta para todos os níveis. Este tipo de empresa precisa de proprietários, gestores e consultores mais competentes do que o normal para crescer. Há escassez de recursos por todos o lados.
Vou chamar de pequenas empresas àquelas com receita bruta anual entre 3 milhões e 30 milhões de dólares. Empresas abaixo de U$ 3 milhões não estão sendo consideradas neste texto.
Você pergunta sobre quais seriam os valores ESSENCIAIS. Eu respondo que o ESSENCIAL é ter valores. Não há uma lista correta de valores, o pulo do gato. Os valores são o DNA da empresa, a carga genética dos seus fundadores. Estes devem refletir sobre como comunicá-los por toda a empresa e somente devem selecionar empregados e parceiros com carga genética semelhante. Vejo contratação de pessoas que não têm qualquer similaridade de alma com os donos do negócio. O fracasso destas pessoas e da empresa é muito provável!
Pessoas são o ativo mais importante de uma empresa! Certo? Não, está errado! As pessoas CERTAS são o ativo mais importante das organizações. E quem são as pessoas certas? São aquelas que têm a genética dos fundadores. Valores não têm qualquer relação com capacitação técnica. Valores referem-se a comportamento e alinhamento de objetivos.
O erro das pequenas empresas? Nem sabem e não refletem sobre isto e formam equipes desastradas e incompetentes. Muitas vezes, empregam quem não tem lugar em mais nenhuma empresa. Ou seja, empregam as sobras. E com sobrasnenhuma empresa chega sequer perto do desenvolvimento.
Alguém poderia me questionar sobre salários. Como atrair profissionais qualificados e com valores semelhantes aos fundadores pagando pouco? Então, eu respondo: e quem disse que uma pequena empresa precisa pagar pouco? Os proprietários precisam abrir mão de certas coisas para crescer. Talvez precisem dar participação efetiva nos resultados da empresa para algumas pessoas. Participação efetiva não é um salário a mais no final do ano. Nem três nem cinco. É participação na sociedade. De forma controlada e minoritária, mas participação!
Comecei a prestar consultoria em maio de 1997 para um pequeno negócio de 8 milhões de dólares/ano. Elaborei com a família um plano audacioso: dispensamos as sobras e contratamos 3 gestores: um ex-Souza Cruz, um ex-Gerdau e o terceiro, um ex-Renault. Eles ganhavam mais salários do que o pró-labore mais a distribuição de lucros do dono. Implantamos um sistema de gestão de primeiro mundo e o dono entendeu que ele não contratou três superprofissionais para que eles lhe obedecessem e sim para que eles o salvassem!
O resultado: em dezembro de 1999, a empresa fechou o ano com faturamento de 38 milhões de dólares. E têm desde então crescido anualmente cerca de 13 %. A atitude da família foi bem diferente dos padrões de mediocridade que rondam os pequenos. Continuar com as sobras, economizar café e material de expediente e fazer com todo o respeito trabalhos limitados com o Sebrae seria o esperado. Entretanto, os acionistas pensaram grande. É uma empresa de serviços e trabalha para clientes grandes que ficaram surpresos positivamente quando viram um fornecedor pequeno mas com sistema e funcionários de empresa grande. As vendas cresceram naturalmente. Os 3 diretores contratados estão ainda lá. Conversei com todos eles. Aceitaram trabalhar em uma empresa pequena porque praticamente dobraram seus salários. E porque ganharam muito liberdade e um consultor para implementar um sistema de gestão com as melhores práticas. Esta empresa foi a primeira do mundo a certificar-se na ISO 9001 no seu setor.
Resumindo, amigo Daniel, o essencial é ter valores e cercar-se de gente ótima. O processo de seleção de pessoal é fundamental. Quanto às melhores práticas, elas são mundiais. Cultura se adquire e se muda. Na maioria das vezes, com novas pessoas e novo sistema de gestão.
Ah, ia esquecendo: os dirigentes (para qualquer porte) devem contratar consultorias e devem ler muito sobre negócios. Empresas que crescem são caracterizadas por empreendedorismo, liderança forte, métodos de gestão, capacitação técnica e tecnologia.

O crescimento das pequenas empresas é um tema fundamental para o desenvolvimento econômico de uma sociedade e é pouco abordado na literatura dos negócios. Quais são os fatores decisivos para qualquer pequena empresa crescer?