O coitadismo

O coitadismo
Quem nasce na classe média ou acima desta no Brasil nasce já com um grande complexo de culpa. Culpa de ter o que comer e o que vestir enquanto tantos sofrem na miséria. À mesa, muitas vezes, os pais dizem isto para os filhos que não querem comer: ...você não quer comer e lá fora há tanta gente passando fome, etc”. Reforça-se o complexo de culpa.
Quando nós, os complexados da culpa da miséria alheia, chegamos ao poder nas empresas, como diretores, conselheiros e gerentes, chegamos carregando esta culpa. Quem tem culpa quer se DESCULPAR!!! Quer extirpar esta culpa. E, desta forma, passamos a desculpar os pequenos deslizes. Dizemos: ...coitadinhos, são pobres, não tiveram educação básica, são humildes e sofredores etc. E os pequenos deslizes vão se transformando nos grandes furos que atormentam e empobrecem as empresas. Não demitimos porque o cara está conosco há muitos anos, porque “pelo menos está trabalhando e não está roubando, porque tem família, porque é muito velho, porque é muito novo, e por aí vamos nos perdendo.
E nossas empresas vão empobrecendo, gerando menos impostos, mais miséria e o ciclo perverso se perpetua. Onde vamos parar? Onde talvez já estejamos! Em uma situação de pobreza e de fraqueza empresarial.

Todos passam a ter desculpas pessoais e sociais para não fazerem o que deve ser feito. Somos uma geração de fracos, de frouxos!!! Na madrugada de sábado, 24/09, não consegui que um cara vendendo acintosamente SKOL para menores em frente a um clube classe média alta em Porto Alegre fosse punido pela polícia militar por fraqueza do poder público. O policial alegou não ser sua responsabilidade – pediu que eu procurasse a Secretaria Municipal de Indústria e Comércio (imaginem eu achar alguém na Secretaria às 2 h da madrugada de domingo) – e ainda alegou que estava muito cansado, já atendera a 6 ocorrências naquela noite e não havia sequer jantado. O clube disse que ia tomar providências e não tomou. Quando retornei ao local para apanhar minha filha, tudo estava como no início da festa. SKOL para menores, sem qualquer problema.

O policial tem a desculpa de não ser com ele o assunto, de ganhar pouco e trabalhar muito e de estar com fome, a SMIC certamente me diria que não tem como fiscalizar tudo, o clube talvez alegue que não tem responsabilidade sobre a rua, o prefeito talvez diga que não sabia de nada (se o Presidente não sabe, imagina o prefeito), o secretário de segurança talvez alegue que o problema é municipal e...por aí vai.

O resultado? Alguns minutos antes de me deparar com esta infração, presenciei em uma esquina de Porto Alegre um carro capotado e muito sangue no chão. Alguma surpresa?

Não envio este artigo para resolver o problema do Brasil e de nossa pobre sociedade. Mas esta fraqueza das ruas e do poder público está também dentro das empresas privadas. É o COITADISMO!!! Ninguém é culpado, todos são coitados!!! Se você que me lê tem poder, seja duro!!! Não tolere os pequenos deslizes. Vender SKOL para menores talvez seja encarado por alguém como “um pequeno deslize”. Mas este leva a outro maior e a outro maior e aí chegamos nos grandes prejuízos. Nossas empresas, de uma forma geral, são muito tolerantes. A tolerância com os pequenos deslizes NÃO É UMA ATITUDE PREVENTIVA.

Com o tempo descobri algo: encontro muito mais bondade e respeito com o próximo nos níveis estratégicos e de poder das empresas (proprietários, diretores etc) do que nos níveis operacionais. Os “coitadinhos” sabem de sua posição e utilizam sua própria pobreza de forma muitas vezes cruel. Esteja atento para estes fatos. Preserve a empresa, acima de tudo. As empresas privadas constituem o movimento social mais evoluído, pois não têm proteção e estão sujeitas ao veto social.

Um abraço fraterno a todos.